.Olgária Matos entre Direitos, Desejos e Utopia
Entrevistada pelo projeto Revoluções, filósofa vê em 1968 o momento em que a ideia de transformação social começou a mudar
Recomeça esta semana, em São Paulo, uma experiência político-estética de rara atualidade. No instante em que ressurgem, no mundo árabe, os grandes movimentos de transformação social promovidos pela multidão, o projeto Revoluções debate conceitualmente esta forma de mudar o mundo. Iniciado em abril, ele desdobra-se, agora, em três novas atividades: o seminário Revoluções: uma política do sensível (20 e 21/5); a abertura de uma exposição de fotos organizada por Henrique Xavier, a partir de trabalho de Michel Löwy (21/5); e a instigante oficina Mídia e Revolução: culturas de vanguarda (22 e 24/5).
Muito mais que uma série de eventos, Revoluções – um projeto que Outras Palavras ajudou a conceber – é um convite a refletir. Por isso, produz, em certos momentos, diálogos e entrevistas, disponíveis em seu site. Autora, entre muitas outras obras, de As barricadas do desejo, sobre o Maio de 1968 francês, a filósofa Olgária Matos é uma participantes ativa destes momentos.
O texto abaixo traz a síntese de uma destas conversas, mantida com a equipe de organizadores do seminário. No diálogo, ela falou sobre 1968 – abordando, em especial, seu papel na criação de novos projetos superação do capitalismo (que afloram mais intensamente hoje). Também abordou o sentido e atualidade da noção de direitos humanos, as armadilhas da libertação do corpo conjugada com aprisionamento do espírito e (com viés um tanto conservador…) as redes sociais e o mundo virtual. Ao final, expressou, a respeito da noção de Utopia, uma visão que vale a pena conhecer e discutir.
Projeto Revoluções: Por vezes, seus ensaios refletem as inquietações de uma geração que vivenciou e produziu uma transformação no modo de vida, com novas expectativas no campo do trabalho, da sexualidade ou na comunicação de ideias e ideais. Vivendo as “barricadas do desejo” das lutas de 1968, em que medida aquela pode se sentir representada pela atual luta pelos direitos humanos?
Olgária Matos: – O ano de 1968 foi emblemático por ter procedido à crítica das abstrações conceituais como a luta de classes, a dialética materialista, golpe de Estado como formas de emancipação, colocando no centro da questão o indivíduo.
Não mais o revolucionário profissional e obsessivo, investido da missão histórica de liberar toda a humanidade, pois nenhuma classe social fala pelo universal. Nesse sentido, a luta pelos direitos humanos hoje amplia a noção de direito que passa a abranger as questões subjetivas, além da luta contra todos os tipos de preconceito, sejam religiosos, de classe, de sexo ou gênero, de condições físicas e intelectuais.
Toda essa luta tem o sentido de suavizar as relações entre as pessoas, criando as condições do exercício do respeito, da confiança. Também a percepção da violência não só restrita às questões políticas traz para o debate os direitos dos animais e os da natureza, antes fora do debate institucional.
Projeto Revoluções: A história dos direitos humanos confunde-se com modificações de comportamentos nas relações culturais. Podemos reconhecer aqui o avanço da luta das mulheres, apoiada neste instrumento. De outro modo, há quem afirme que os direitos humanos são um instrumento de manipulação cultural, com valores originados numa cultura burguesa e europeia. Qual a sua posição sobre este paradoxo?
Olgária Matos: A ideia de direitos universais é parte da tradição da filosofia antiga — grega e estoica. Lembre-se que os cínicos, no século IV a.C., contestavam as fronteiras entre os povos que, segundo eles, criavam as rivalidades e as guerras, elaborando as primeiras reflexões sobre o cosmopolitismo. Na sequência, a visão cristã desenvolve a ideia de igualdade radical em dignidade, “todos somos irmãos” ou então, como o poeta John Donne escreveu no século XVII: “todos nós somos páginas de um mesmo livro espalhadas pelo mundo.”
Isto é, foi a luta pela igualdade universal abstrata – burguesa — que facultou a possibilidade de luta pelo direito à diferença, e não o contrário.
Projeto Revoluções: Um dos aspectos levantados por nosso curso remete diretamente aos conflitos de constituições culturais, sobretudo aquele entre a marca subjetiva do desejo e a composição de um todo social, com leis universalmente reconhecidas – em outras palavras, a cisão entre indivíduo e sociedade. Esta cisão colocaria em xeque um dos projetos mais antigos da vida social, isto é, a felicidade universalizada, ou ele amplia o campo de demandas e sua extensão?
Olgária Matos: Por sua natureza, a lei é “abstrata”, “impessoal”, e assim tem sua função reguladora da vida social. Como não poderia existir justiça “em si” – universal e abstrata – há sempre um além da lei que diz respeito aos “sentimentos morais”, a um “tato moral” – como o sentimento do pudor – que escapa à legislação.
Esse quantum afetivo é o que cabe ao magistrado prover para que a mais-valia afetiva do que está em jogo na lei possa efetivamente ser considerada. A felicidade é uma palavra indeterminada, mas que tem sentido crítico, uma vez que ela é o que obscuramente guia todas as ações que de uma maneira ou outra buscam o prazer. O pensamento antigo definiu a filosofia como a busca da justa vida e do bem viver que hoje, segundo Adorno, é uma “ciência esquecida”. Quer dizer, a aptidão para a felicidade é algo que se aprende, não se herda, ela exige toda uma educação. Os gregos, por exemplo, encontravam na scholé – no tempo liberado dos constrangimentos da autoconservação – a razão essencial da vida, pois viver nada mais é do que uma determinada maneira de nos utilizarmos do tempo finito que nos foi concedido. Os “cuidados de si” faziam parte do conhecimento da natureza e de nossa natureza, a fim de alcançarmos a “tranquilidade da alma”, uma das figuras da felicidade.
Mas se os gregos valorizavam a prudência, a moderação, a contenção das paixões – que nos fazem infelizes porque nunca determinam exatamente o que desejam – a modernidade valoriza o excesso, o descomedimento que para os antigos era sinônimo de perdição, de extravio, de infelicidade.
E, no mundo contemporâneo, a monotonia e o tédio se instalam no vazio deixado pelo desaparecimento da ideia de “autoconhecimento”’ e autoaprimoramento, e se abandonou para as coisas externas a possibilidade de ser feliz. Substituiu-se o “ser” pelo “ter”, o mercado ocupando o lugar de sucedâneo à busca da felicidade e a posse de bens materiais. Daí o vazio de tudo e a pobreza do mundo interior, atestada pela massificação do uso de drogas, obesidade mórbida, esportes radicais e demais mecanismos de colocar no exterior o que é do domínio subjetivo incontornável.
Projeto Revoluções: Das experiências culturais da segunda metade do século passado, é possível ressaltar um novo olhar sobre o corpo – não mais formado e preparado para as funções sociais “tradicionais” (basicamente, reproduzir e produzir), mas um espaço novo e aberto para a fruição de suas potencialidades. Entretanto, numa sociedade do espetáculo, em que os corpos devem se apresentar como “belos e saudáveis”, há quem afirme que as conquistas de liberdade foram deturpadas ou perdidas. Onde podemos localizar esta mudança?
Olgária Matos: Marcuse nos formulou bem essa questão. O século XX, para todos os fins do consumo, liberou os corpos mas reprimiu a vida do espírito ou, melhor, não liberou o espírito. O que significa que se tratou de uma pseudoliberação que acabou por se converter em uma nova forma de opressão. Se no passado a sexualidade era proibida de se realizar, hoje ela é obrigatória! O corpo – que é o que de mais íntimo possuímos – converteu-se em objeto de exposição (através da pornografia em geral veiculada pelo estilo publicitário) e de banalização. Piercings, tatuagens, nudez etc. são formas de exibição voltadas para si mesmas, já que não são signos distintivos de nenhuma identidade, mas são “comportamentos miméticos”, de massa. Todos copiam a todos sem reflexão, num desejo de identidade e de pertencimento buscados apenas no exterior. São pseudoidentidades e pseudopertencimentos, porque aquele que se tatua não o faz por uma escolha pessoal, mas porque um outro já o fez.
Seria preciso reinventar a ideia de felicidade para a ação não ser ativismo e não senso, mas autorreflexão, conhecimento e prazer neste conhecimento. Os corpos “belos e saudáveis” de hoje nada possuem em comum com aquela empatia do corpo e da alma, em que a beleza do espírito acaba por se revelar nos corpos precários e mortais. O fetichismo da juventude e o desejo de superação de si – os esportistas que sucumbem às drogas e às performances – nada poderiam ter em comum com a saúde do corpo e da alma, porque estas requerem filosofia!
Projeto Revoluções: Outro diagnóstico da contemporaneidade volta-se para o advento das redes sociais no mundo virtual. Nelas, os usuários encontram um espaço para expressar suas individualidades, seja em busca de relacionamentos, seja para divulgar suas ideias, ampliando as vias para a liberdade de expressão. Pensando em seu ensaio “A Identidade: um Estrangeiro em nós” (Discretas Esperanças – Reflexões filosóficas sobre o mundo Contemporâneo, 2006), é possível afirmar que tais manifestações na internet reforçam modelos de identificações que geram “patologias da comunicação”, como a intolerância e o dogmatismo que bloqueiam relações de alteridade? Ou seria este um meio a mais para reverter os laços sociais, configurando vias para a tolerância em uma recente cultura em que a virtualidade assume um papel central?
Olgária Matos: O virtual, as chamadas “amizades à distância”, atesta um “horror do contato”, o evitar a presença factual do outro que, por sua natureza, me contesta. Daí a tendência ao isolamento, ao narcisismo primário, regressivo, ao não contato com o outro, a dificuldade da generosidade e da gratidão, sem o que não há vida ética.
Projeto Revoluções: Um dos elementos possíveis resultantes da dinâmica entre desejo e direitos explode nas manifestações de violência, apresentadas não apenas na necessidade de reconhecimento de suas demandas, como também na instauração de forças paralelas que geram verdadeiros
“Estados dentro do Estado” (sejam as milícias paramilitares, sejam as organizações criminosas). No caso brasileiro, duas estratégias de contenção da violência estão constantemente nos noticiários: as Unidades de Polícia Pacificadoras , nas comunidades em que o tráfico era dominante, e a política de carceragem. Entre uma e outra experiência, podemos afirmar que o brasileiro está experimentando uma nova cultura de paz ou estamos reproduzindo um velho sistema de exclusão social?
Olgária Matos: Esta é uma questão difícil de começar a ser respondida, porque a lei no Brasil não parece ter a função de promover a paz social e a reparação de injustiças. Seja porque nossas leis por vezes parecem ter sido elaboradas para a pólis grega — e portanto não dão conta da violência da sociedade contemporânea –, seja porque não se compreende como ela é aplicada, e no final ela não cria coesão social, mas é vivida como sendo ela mesma violenta, arbitrária e geradora de injustiça. De onde a proliferação das organizações parapoliciais de extermínio etc.
Pode ser também que a ideia de que devamos ser mais compreensivos – complacentes – com os menores infratores, em vez de “conformá-los à boa sociedade”, esteja de fato entregando os jovens (que não têm a noção do limite do permitido e do interdito clara) à vida violenta e breve. Enfim, apesar de eu não me sentir à vontade para tratar de questões tão complexas – eu diria que é com os jovens que a lei deveria ser mais segura a fim de criar a ideia de autoridade legítima etc.
Mas que a mídia hoje tem um papel preponderante no mimetismo social não poderia ser minorado. A mídia impõe comportamentos e produz pensamentos imitados na sociedade. Que se pense o quanto a mídia responde pela conversão da política em espetáculo e as eleições em consumo de imagens de baixa qualidade e baixo padrão de comportamento ético e respeito recíproco ao adversário. A mídia polariza a política criando apenas o amor ou o ódio aos governantes, o que pouco tem em comum com a inteligência da vida pública e de um espaço comum compartilhado. Cada vez mais proliferam os particularismos e desaparecem valores comuns admirados e respeitados por todos – ou que tendessem simbolicamente a isso.
A educação medíocre que se preconiza para a grande massa – sob a alegação de que a “verdadeira cultura lhe é inacessível” – exclui a maioria da “vida do espírito”, que retorna à condição de privilégio de uma elite, esta também cada vez mais precarizada, porque o fim do valor filosófico e existencial da cultura impõe o “naturalismo“ dos comportamentos e sua informalidade como a medida da vida em comum. Daí as diversas formas de incivilidade, desde o comportamento das pessoas no trânsito, passando pelo fim das “boas maneiras” no tratamento entre as pessoas, até das formas mais graves de negação do Outro, como na criminalidade. Pena que os mais pobres tenham chegado à “universidade”, no momento em que o “ensino superior” não é superior a nada, não passa de um segundo grau mal dado e malfeito.
Mas como a história é devir – ou inquietação permanente – há sempre o inesperado que pode nos dar boas surpresas. Esperemos que o Egito tenha realmente sua “primavera”, como os franceses tiveram duas, a da Comuna de Paris que este ano comemora 140 anos, e o maio de 68 e suas “barricadas do desejo”. Porque os egípcios já nos deram sua dimensão simbólica, protegendo o Museu – patrimônio de toda a humanidade – dos oportunistas e saqueadores. Pois pode ser que as utopias não mudem o mundo, mas são elas que nos põe a caminho.
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quinta-feira, 19 de maio de 2011
sexta-feira, 1 de abril de 2011
sábado, 26 de março de 2011
FANTASMAS PODEROSOS
Fantasmas poderosos
Nenhum ‘ex’ dorme em paz depois de ter entrado em contato com os prazeres do poder
Marco Aurélio Nogueira
Fantasmas e pesadelos costumam atormentar todos os que tiveram poder um dia. O universo dos "ex" é heterogêneo, mas nenhum deles dorme inteiramente em paz depois de ter entrado em contato com os prazeres que integram o cotidiano de um poderoso. Mesmo suas agruras e aborrecimentos são de um tipo especial. Viciam, causam dependência.
A maldição não perdoa ninguém, ainda que nem todos reajam do mesmo modo. Há os que sofrem em público e os que se recolhem, os discretos e os escandalosos, os que retomam a vida de antes e seguem em frente e os que não se conformam e não sabem o que fazer. Quanto mais alto o grau de poder, maior o problema. Quem já foi presidente da República tem mais dificuldade para assimilar a perda súbita ou anunciada de poder do que um chefe de seção desalojado do cargo.
O filósofo inglês Thomas Hobbes escreveu no século 17 que a tendência geral dos humanos era "um perpétuo e irrequieto desejo de poder, que cessa apenas com a morte". Segundo ele, isso acontecia não porque os homens buscassem um prazer sempre mais intenso, mas porque intuíam que a conservação e a ampliação constante do poder eram essenciais para que mantivessem o que possuíam. Maquiavel, na Itália, se inquietava diante da dificuldade para "determinar com clareza que espécie de homem é mais nociva numa república, a dos que desejam adquirir o que não possuem ou a dos que só querem conservar as vantagens já alcançadas". Não economizaria palavras: "A sede de poder é tão forte quanto a sede de vingança, se não for mais forte ainda". Idêntica preocupação teria Max Weber, que dizia que quem mexe com o poder faz um "pacto com potências diabólicas" e vai descobrindo que o bem e o certo nem sempre têm significado unívoco. O poder tem razões que a razão desconhece.
Alguém que deixa o poder defronta-se antes de tudo com o fantasma daquilo que perde: os rituais, a vida distinta, os mimos e mesuras dos subordinados, o conforto do palácio. Precisa se acostumar com os ruídos alheios e esquecer o som da própria voz. Há quem diga que sente certo alívio ao voltar ao anonimato e se libertar da agenda carregada, das liturgias cansativas, do excesso de exposição. Mas a ausência disso pode se assemelhar a uma crise de abstinência, que termina por levar o ex-poderoso à busca inglória de um lugar ao sol semelhante ao que desfrutava nos dias de fausto.
Talvez para compensar tais dissabores, mas também para dignificar personagens que tiveram um papel na história, a República brasileira concede regalias vitalícias aos ex-presidentes: automóveis, funcionários e homenagens, além dos salários. Algo semelhante ocorre nos Estados Unidos. Uma vez presidente, sempre presidente.
Um fantasma mais assustador é saber o que fazer com as longas horas do dia, dar rumo à vida, retomar a atividade anterior ou iniciar novo percurso. O esforço para recuperar o que ficou para trás quase sempre é em vão. Muito tempo se passou, novos hábitos se cristalizaram, carreiras profissionais foram interrompidas. Aí mora o desejo de permanecer ativo na mesma área em que obteve fama e prestígio, falando e agindo como se ainda fosse o mandatário. É instigado a analisar falas e estilo de quem está no lugar que um dia foi seu. Chovem-lhe oportunidades para que atue como sombra ou alter ego, alguém que pode ser conselheiro, ponderar, sugerir, auxiliar. Ex-presidentes costumam valer muito no mercado das palestras e conferências, por exemplo. Precisam se esforçar para não cair em tentação.
Nesse ponto, o ex-poderoso depara-se com seu pior pesadelo: o de sair perdendo ao ser comparado com o sucessor. As comparações são inevitáveis. Inimigos as incentivam, rasgam elogios ao rei posto para despertar o ciúme do rei morto e intrigar os dois.
Não é, portanto, acidental que o ex-presidente Lula esteja repetindo que "o sucesso da Dilma é o meu sucesso; seu fracasso é o meu fracasso". Ele não pode correr o risco de ser visto como estando a ofuscar sua sucessora, nem deixar que sugiram que a nova presidente o supera em algum quesito. Tem razão em reclamar da malandragem de seus adversários, que, depois de terem passado anos dizendo que ele dava continuidade ao governo FHC, agora não param de falar que a gestão Dilma - carne de sua carne - está rompendo com os oito anos da sua Presidência. Mas também é verdade que ele, ao fazer isso, procura se aproximar da imagem positiva que Dilma possa estar obtendo junto à opinião pública. Não se trata só de mágoa, há muito cálculo no gesto.
Amado e odiado indistintamente, o poder perturba, corrompe e alucina. Reprime, castiga e prejudica, mas também acalenta, protege e beneficia. Costuma ser utilizado para conservar e para transformar. É instrumento e objeto de desejo, encargo e meio de vida. Sua "face demoníaca" não perdoa os que com ela convivem, sejam eles presidentes da República, governadores de Estado ou CEOs de uma multinacional. O poder sobe à cabeça, cega, embriaga. Pode ser letal.
MARCO AURÉLIO NOGUEIRA É PROFESSOR DE TEORIA POLÍTICA DA UNESP. AUTOR DE O ENCONTRO DE JOAQUIM NABUCO COM A POLÍTICA (PAZ E TERRA)
Tópicos: , Suplementos, Geral
Nenhum ‘ex’ dorme em paz depois de ter entrado em contato com os prazeres do poder
Marco Aurélio Nogueira
Fantasmas e pesadelos costumam atormentar todos os que tiveram poder um dia. O universo dos "ex" é heterogêneo, mas nenhum deles dorme inteiramente em paz depois de ter entrado em contato com os prazeres que integram o cotidiano de um poderoso. Mesmo suas agruras e aborrecimentos são de um tipo especial. Viciam, causam dependência.
A maldição não perdoa ninguém, ainda que nem todos reajam do mesmo modo. Há os que sofrem em público e os que se recolhem, os discretos e os escandalosos, os que retomam a vida de antes e seguem em frente e os que não se conformam e não sabem o que fazer. Quanto mais alto o grau de poder, maior o problema. Quem já foi presidente da República tem mais dificuldade para assimilar a perda súbita ou anunciada de poder do que um chefe de seção desalojado do cargo.
O filósofo inglês Thomas Hobbes escreveu no século 17 que a tendência geral dos humanos era "um perpétuo e irrequieto desejo de poder, que cessa apenas com a morte". Segundo ele, isso acontecia não porque os homens buscassem um prazer sempre mais intenso, mas porque intuíam que a conservação e a ampliação constante do poder eram essenciais para que mantivessem o que possuíam. Maquiavel, na Itália, se inquietava diante da dificuldade para "determinar com clareza que espécie de homem é mais nociva numa república, a dos que desejam adquirir o que não possuem ou a dos que só querem conservar as vantagens já alcançadas". Não economizaria palavras: "A sede de poder é tão forte quanto a sede de vingança, se não for mais forte ainda". Idêntica preocupação teria Max Weber, que dizia que quem mexe com o poder faz um "pacto com potências diabólicas" e vai descobrindo que o bem e o certo nem sempre têm significado unívoco. O poder tem razões que a razão desconhece.
Alguém que deixa o poder defronta-se antes de tudo com o fantasma daquilo que perde: os rituais, a vida distinta, os mimos e mesuras dos subordinados, o conforto do palácio. Precisa se acostumar com os ruídos alheios e esquecer o som da própria voz. Há quem diga que sente certo alívio ao voltar ao anonimato e se libertar da agenda carregada, das liturgias cansativas, do excesso de exposição. Mas a ausência disso pode se assemelhar a uma crise de abstinência, que termina por levar o ex-poderoso à busca inglória de um lugar ao sol semelhante ao que desfrutava nos dias de fausto.
Talvez para compensar tais dissabores, mas também para dignificar personagens que tiveram um papel na história, a República brasileira concede regalias vitalícias aos ex-presidentes: automóveis, funcionários e homenagens, além dos salários. Algo semelhante ocorre nos Estados Unidos. Uma vez presidente, sempre presidente.
Um fantasma mais assustador é saber o que fazer com as longas horas do dia, dar rumo à vida, retomar a atividade anterior ou iniciar novo percurso. O esforço para recuperar o que ficou para trás quase sempre é em vão. Muito tempo se passou, novos hábitos se cristalizaram, carreiras profissionais foram interrompidas. Aí mora o desejo de permanecer ativo na mesma área em que obteve fama e prestígio, falando e agindo como se ainda fosse o mandatário. É instigado a analisar falas e estilo de quem está no lugar que um dia foi seu. Chovem-lhe oportunidades para que atue como sombra ou alter ego, alguém que pode ser conselheiro, ponderar, sugerir, auxiliar. Ex-presidentes costumam valer muito no mercado das palestras e conferências, por exemplo. Precisam se esforçar para não cair em tentação.
Nesse ponto, o ex-poderoso depara-se com seu pior pesadelo: o de sair perdendo ao ser comparado com o sucessor. As comparações são inevitáveis. Inimigos as incentivam, rasgam elogios ao rei posto para despertar o ciúme do rei morto e intrigar os dois.
Não é, portanto, acidental que o ex-presidente Lula esteja repetindo que "o sucesso da Dilma é o meu sucesso; seu fracasso é o meu fracasso". Ele não pode correr o risco de ser visto como estando a ofuscar sua sucessora, nem deixar que sugiram que a nova presidente o supera em algum quesito. Tem razão em reclamar da malandragem de seus adversários, que, depois de terem passado anos dizendo que ele dava continuidade ao governo FHC, agora não param de falar que a gestão Dilma - carne de sua carne - está rompendo com os oito anos da sua Presidência. Mas também é verdade que ele, ao fazer isso, procura se aproximar da imagem positiva que Dilma possa estar obtendo junto à opinião pública. Não se trata só de mágoa, há muito cálculo no gesto.
Amado e odiado indistintamente, o poder perturba, corrompe e alucina. Reprime, castiga e prejudica, mas também acalenta, protege e beneficia. Costuma ser utilizado para conservar e para transformar. É instrumento e objeto de desejo, encargo e meio de vida. Sua "face demoníaca" não perdoa os que com ela convivem, sejam eles presidentes da República, governadores de Estado ou CEOs de uma multinacional. O poder sobe à cabeça, cega, embriaga. Pode ser letal.
MARCO AURÉLIO NOGUEIRA É PROFESSOR DE TEORIA POLÍTICA DA UNESP. AUTOR DE O ENCONTRO DE JOAQUIM NABUCO COM A POLÍTICA (PAZ E TERRA)
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sexta-feira, 18 de março de 2011
terça-feira, 8 de março de 2011
Das pioneiras incineradas
Das pioneiras às incineradas: política e violência com mulheres na Argentina por Ariel Palacios
08.março.2011 16:12:2011
“Os direitos não se mendigam… conquistam-se!” costumava afirmar Julieta Lanteri, a primeira sufragista da América do Sul.Sua biógrafa, a jornalista Araceli Bellota, a define com estas palavras: “foi uma consciente transgressora”.
No dia internacional da mulher, conto brevemente a história da primeira sufragista argentina (e da América do Sul, Julieta Lanteri). Depois, passamos ao quadro da crescente violência contra as mulheres na Argentina. E terminamos com um panorama do peso feminino no poder presidencial e parlamentar.
Julieta Lanteri (1873-32) foi uma pioneira das lutas pela igualdade de direitos das mulheres. Sem marido político para respaldar sua carreira, nem fundos estatais, Lanteri foi um símbolo de liberdade nas primeiras décadas do século XX.
Nascida na Itália, desembarcou aos seis anos de idade em Buenos Aires, acompanhada por seus pais.
Aos 18 anos decidiu que estudaria Medicina. No entanto, a profissão estava vetada para as mulheres. Lanteri contornou a proibição com uma permissão especial do decano da faculdade, Leopoldo Montes de Oca.
Entrou na faculdade em 1896 e formou-se em 1907.
Formada, fundou com sua colega Cecilia Grierson a Associação Universitária Argentina. Na sequência, fez seu doutorado em Medicina e Cirurgia.
“Solteirona” para os padrões da época, aos 36 anos ela casou-se com o americano (criado na Espanha) Alberto Renshaw, que não tinha fortuna, nem influências políticas ou intelectuais, e de quebra, era 14 anos mais jovem do que ela.
Na época, Lanteri, que sempre vestia-se impecavelmente de branco, estudava intensamente sobre saúde mental e decidiu candidatar-se para a cátedra de psiquiatria.
Mas, a faculdade negou seu pedido acadêmico com o insólito argumento de que era “estrangeira” (apesar de ter passado a maior parte de sua vida na Argentina).
Lanteri não se intimidou e solicitou a cidadania argentina. Após um ano de lutas, conseguiu a carta de cidadania (a segunda concedida no país).
O seguinte passo foi o de lutar pelo voto, na época um direito somente exercido pelos homens.
Em julho 1911 a prefeitura de Buenos Aires convocou os moradores da cidade para que se registrassem com dados atualizados nas listas de eleitores. A convocação indicava que deviam registrar-se “os cidadãos maiores de idade, residentes na cidade há pelo menos um ano, que tenham um comércio, indústria ou exerçam uma profissão liberal e paguem impostos municipais com valor mínimo de 100 pesos”.
Lanteri percebeu que a norma tinha uma brecha: ela não indicava nada sobre o sexo. Desta forma, um dia depois de conseguir a cidadania argentina, registrou-se nas listas eleitorais, e em novembro de 1911 apresentou-se para votar.
Na contra-mão do murmurinho generalizado e dos protestos de diversos homens que indicaram “indignação” com a presença feminina de Julieta Lanteri na sala de voto, o presidente de mesa Adolfo Saldías afirmou com entusiasmo: “estou alegre de ser quem assinará o documento do primeiro voto de uma mulher neste país e na América do Sul”.
Foi o primeiro e último voto feminino em 40 anos.
A notícia espalhou-se rapidamente, e em poucos dias o assunto era a polêmica da cidade. Na sequência, a Câmara de Vereadores de Buenos Aires emitiu uma lei que proibia explicitamente o voto às mulheres, alegando que os registros dos eleitores era feito com as listas dos registrados para o serviço militar.
Lanteri não se intimidou. Sem vacilar, apresentou-se perante as autoridades militares, exigindo sua admissão para o serviço militar.
Expulsa pelos funcionários dos quartéis, Lanteri foi ao próprio Ministério de Guerra e Marinha pedir ao ministro que fosse aceita como recruta.
A luta de Lanteri prolongou-se ao longo da década. Mas, em 1919, encontrou uma saída: a Constituição Nacional impedia as mulheres de votar… mas não havia impedimento para que fossem eleitas.
Desta forma, criou um partido, o Partido Nacional Feminista, e em abril de 1919 candidatou-se a deputada. Desta forma, tornou-se a primeira mulher a ser candidata na História da Argentina. Não foi eleita. Mas não desistiu de sua luta.
Em 1932 foi atropelada de forma misteriosa em pleno centro portenho, na esquina da avenida Diagonal Norte e da rua Suipacha. Tinha 59 anos e estava enfrentando o governo do general Agustín Justo.
“Os direitos não se mendigam… conquistam-se!” costumava afirmar Julieta Lanteri, a primeira sufragista da América do Sul.
VOTO - A socialista Alicia Moreau de Justo, que fundou em 1918 a União Feminista Nacional, elaborou um projeto de lei em 1932 que estabelecia o sufrágio feminino. No entanto, foi necessário esperar até 1947, quando Eva Perón, cujo marido era o presidente Juan Domingo Perón, ressuscitou a ideia e conseguiu sua aprovação. Desta forma, as argentinas puderam votar em massa em 1951.
Nos tempos da Inquisição: Ilustração de 1531 mostra uma mulher, acusada de ser bruxa, sendo queimada em uma fogueira na cidade de Schlitach. A mulher em questão era acusada de ter sido cúmplice do “demônio” no incêndio da cidade, localizada no lado esquerdo da imagem. O livro com ilustração está na Zentralbibliothek, Zurich, Suíça. Atualmente, no século XXI, mulheres continuam sendo queimadas vivas em diversas partes do mundo por seus cônjuges, ex-cônjuges e similares.
MULHERES QUEIMADAS - O dia internacional das mulheres está tendo na Argentina um sabor amargo, já que desde o início deste ano 13 mulheres foram queimadas por seus cônjuges/namorados/ex-maridos/amantes. Destas, apenas quatro sobreviveram.
O fenômeno está chamando a atenção, já que em todo 2010 o número de mulheres queimadas por homens foi de 11, volume que já estava causando grande preocupação no ano passado.
O fenômeno, afirmam os analistas, parece ter aumentado depois que o baterista Eduardo Vázquez, ex-integrante do grupo de rock “Callejeros”, foi acusado de incinerar sua esposa, Wanda Taddei, em fevereiro do ano passado. Wanda morreu dias depois que seu marido lhe jogasse álcool e acendesse um cigarro ao lado dela. O ato lhe provocou graves queimaduras em 60% do corpo.
O último caso, registrado neste fim de semana, ocorreu na província de Santiago del Estero, A vítima, uma garota de 17 anos, mãe de um bebê de 7 meses, foi queimada por seu namorado, de 22 anos. A jovem, que saiu correndo em chamas de sua casa, foi socorrida pelos vizinhos. O namorado, que está detido, alegou que estava na cama, brincando com o bebê, quando repentinamente viu a mulher “inexplicavelmente” em chamas.
A penúltima vítima, em fevereiro, era de Florencio Varela, na Grande Buenos Aires. Na ocasião o marido da vítima a banhou em acetona e depois lhe jogou um fósforo aceso.
Neste domingo, na província de Santa Fe, outro homem tentou queimar sua namorada, grávida de 8 meses. No entanto, foi salva a tempo por seu cunhado.
Na Argentina no ano passado um total de 260 mulheres foram assassinadas dentro de crimes classificados de “violência de gênero”.
Nos primeiros dois meses deste ano treze mulheres haviam sido assassinadas em toda a Argentina por violência de gênero.
DADOS:
- Do total de mulheres vítimas de violência de gênero, 18% são jovens de menos de 18 anos de idade.
- Do total de mulheres vítimas de violência de gênero, 51% foram alvo dos ataques de cônjuges, ex-cônjuges ou amantes e namorados.
PESO PRESIDENCIAL – Em 1974 María Estela Martínez de Perón – uma ex-dançarina de cabaré no Panamá – assumiu a presidência da Argentina. Mais conhecida por seu apelido, “Isabelita”, ela chegava ao poder por ser a vice-presidente do marido defunto, Juan Domingo Perón, que no ano anterior havia sido eleito nas urnas.
Isabelita durou menos de dois anos no posto. Controlada pela eminência parda do governo, o ministro José López Rega, Isabelita exerceu uma presidência desorientada e caótica. Foi derrubada por um golpe militar em 1976.
Isabelita, formalmente, foi a primeira mulher presidente da Argentina. No entanto, assumiu por ser a vice do marido.
A primeira mulher a ser eleita diretamente para o cargo de presidente foi Cristina Kirchner, que sucedeu seu próprio marido, Néstor Kirchner, na presidência do país.
Nas eleições que venceu com 45% dos votos, sua principal adversária foi outra mulher, Elisa Carrió, líder da opositora Coalizão Cívica, que obteve 23% dos votos.
Desta forma, as duas mulheres obtiveram juntas 68% dos votos emitidos.
PESO PARLAMENTAR - Em 1991, durante o governo do presidente Carlos Menem (1989-99), o Congresso Nacional aprovou a lei que determina que os partidos políticos são obrigados a contar com um mínimo de um terço de candidatas mulheres.
Na época, a Câmara de Deputados e o Senado somente contavam com 6% de presença feminina.
Os resultados dessa lei, a primeira desse gênero nas Américas, foram comprovados em 1993. Graças à nova norma, a proporção de mulheres parlamentares subiu para 13,6% em 1993.
Atualmente as mulheres ocupam 38,8% das cadeiras do Senado. Além disso, estão presentes em 36,5% das cadeiras da Câmara de Deputados na Argentina.
PESO MINISTERIAL - Apesar da presença de uma mulher na presidência da Argentina, o peso feminino no gabinete presidencial é baixo. De um total de 16 pastas a presidente Cristina somente possui três mulheres ministras (uma delas é sua própria cunhada, Alicia Kirchner, ministra que herdou do marido e antecessor, o ex-presidente Néstor Kirchner).
Isto é, o gabinete possui apenas 18,7% de mulheres com hierarquia ministerial.
Além disso, das cinco secretarias de Estado do governo Cristina, nenhuma é comandada por mulheres.
UM BAIRRO ‘FEMININO’: As ruas de Puerto Madero, bairro criado nos anos 90 em Buenos Aires, conta exclusivamente com ruas com nomes de mulheres argentinas que lutaram pelos direitos de igualdade. Entre elas há médicas, intelectuais, políticas, líderes sociais, escritoras e até heroínas da independência.
Para mais detalhes sobre cada uma delas, clique aqui.
E para terminar a jornada, duas tirinhas de Mafalda… elas são dos anos 60. Mas é impressionante como são vigentes.
res
08.março.2011 16:12:2011
“Os direitos não se mendigam… conquistam-se!” costumava afirmar Julieta Lanteri, a primeira sufragista da América do Sul.Sua biógrafa, a jornalista Araceli Bellota, a define com estas palavras: “foi uma consciente transgressora”.
No dia internacional da mulher, conto brevemente a história da primeira sufragista argentina (e da América do Sul, Julieta Lanteri). Depois, passamos ao quadro da crescente violência contra as mulheres na Argentina. E terminamos com um panorama do peso feminino no poder presidencial e parlamentar.
Julieta Lanteri (1873-32) foi uma pioneira das lutas pela igualdade de direitos das mulheres. Sem marido político para respaldar sua carreira, nem fundos estatais, Lanteri foi um símbolo de liberdade nas primeiras décadas do século XX.
Nascida na Itália, desembarcou aos seis anos de idade em Buenos Aires, acompanhada por seus pais.
Aos 18 anos decidiu que estudaria Medicina. No entanto, a profissão estava vetada para as mulheres. Lanteri contornou a proibição com uma permissão especial do decano da faculdade, Leopoldo Montes de Oca.
Entrou na faculdade em 1896 e formou-se em 1907.
Formada, fundou com sua colega Cecilia Grierson a Associação Universitária Argentina. Na sequência, fez seu doutorado em Medicina e Cirurgia.
“Solteirona” para os padrões da época, aos 36 anos ela casou-se com o americano (criado na Espanha) Alberto Renshaw, que não tinha fortuna, nem influências políticas ou intelectuais, e de quebra, era 14 anos mais jovem do que ela.
Na época, Lanteri, que sempre vestia-se impecavelmente de branco, estudava intensamente sobre saúde mental e decidiu candidatar-se para a cátedra de psiquiatria.
Mas, a faculdade negou seu pedido acadêmico com o insólito argumento de que era “estrangeira” (apesar de ter passado a maior parte de sua vida na Argentina).
Lanteri não se intimidou e solicitou a cidadania argentina. Após um ano de lutas, conseguiu a carta de cidadania (a segunda concedida no país).
O seguinte passo foi o de lutar pelo voto, na época um direito somente exercido pelos homens.
Em julho 1911 a prefeitura de Buenos Aires convocou os moradores da cidade para que se registrassem com dados atualizados nas listas de eleitores. A convocação indicava que deviam registrar-se “os cidadãos maiores de idade, residentes na cidade há pelo menos um ano, que tenham um comércio, indústria ou exerçam uma profissão liberal e paguem impostos municipais com valor mínimo de 100 pesos”.
Lanteri percebeu que a norma tinha uma brecha: ela não indicava nada sobre o sexo. Desta forma, um dia depois de conseguir a cidadania argentina, registrou-se nas listas eleitorais, e em novembro de 1911 apresentou-se para votar.
Na contra-mão do murmurinho generalizado e dos protestos de diversos homens que indicaram “indignação” com a presença feminina de Julieta Lanteri na sala de voto, o presidente de mesa Adolfo Saldías afirmou com entusiasmo: “estou alegre de ser quem assinará o documento do primeiro voto de uma mulher neste país e na América do Sul”.
Foi o primeiro e último voto feminino em 40 anos.
A notícia espalhou-se rapidamente, e em poucos dias o assunto era a polêmica da cidade. Na sequência, a Câmara de Vereadores de Buenos Aires emitiu uma lei que proibia explicitamente o voto às mulheres, alegando que os registros dos eleitores era feito com as listas dos registrados para o serviço militar.
Lanteri não se intimidou. Sem vacilar, apresentou-se perante as autoridades militares, exigindo sua admissão para o serviço militar.
Expulsa pelos funcionários dos quartéis, Lanteri foi ao próprio Ministério de Guerra e Marinha pedir ao ministro que fosse aceita como recruta.
A luta de Lanteri prolongou-se ao longo da década. Mas, em 1919, encontrou uma saída: a Constituição Nacional impedia as mulheres de votar… mas não havia impedimento para que fossem eleitas.
Desta forma, criou um partido, o Partido Nacional Feminista, e em abril de 1919 candidatou-se a deputada. Desta forma, tornou-se a primeira mulher a ser candidata na História da Argentina. Não foi eleita. Mas não desistiu de sua luta.
Em 1932 foi atropelada de forma misteriosa em pleno centro portenho, na esquina da avenida Diagonal Norte e da rua Suipacha. Tinha 59 anos e estava enfrentando o governo do general Agustín Justo.
“Os direitos não se mendigam… conquistam-se!” costumava afirmar Julieta Lanteri, a primeira sufragista da América do Sul.
VOTO - A socialista Alicia Moreau de Justo, que fundou em 1918 a União Feminista Nacional, elaborou um projeto de lei em 1932 que estabelecia o sufrágio feminino. No entanto, foi necessário esperar até 1947, quando Eva Perón, cujo marido era o presidente Juan Domingo Perón, ressuscitou a ideia e conseguiu sua aprovação. Desta forma, as argentinas puderam votar em massa em 1951.
Nos tempos da Inquisição: Ilustração de 1531 mostra uma mulher, acusada de ser bruxa, sendo queimada em uma fogueira na cidade de Schlitach. A mulher em questão era acusada de ter sido cúmplice do “demônio” no incêndio da cidade, localizada no lado esquerdo da imagem. O livro com ilustração está na Zentralbibliothek, Zurich, Suíça. Atualmente, no século XXI, mulheres continuam sendo queimadas vivas em diversas partes do mundo por seus cônjuges, ex-cônjuges e similares.
MULHERES QUEIMADAS - O dia internacional das mulheres está tendo na Argentina um sabor amargo, já que desde o início deste ano 13 mulheres foram queimadas por seus cônjuges/namorados/ex-maridos/amantes. Destas, apenas quatro sobreviveram.
O fenômeno está chamando a atenção, já que em todo 2010 o número de mulheres queimadas por homens foi de 11, volume que já estava causando grande preocupação no ano passado.
O fenômeno, afirmam os analistas, parece ter aumentado depois que o baterista Eduardo Vázquez, ex-integrante do grupo de rock “Callejeros”, foi acusado de incinerar sua esposa, Wanda Taddei, em fevereiro do ano passado. Wanda morreu dias depois que seu marido lhe jogasse álcool e acendesse um cigarro ao lado dela. O ato lhe provocou graves queimaduras em 60% do corpo.
O último caso, registrado neste fim de semana, ocorreu na província de Santiago del Estero, A vítima, uma garota de 17 anos, mãe de um bebê de 7 meses, foi queimada por seu namorado, de 22 anos. A jovem, que saiu correndo em chamas de sua casa, foi socorrida pelos vizinhos. O namorado, que está detido, alegou que estava na cama, brincando com o bebê, quando repentinamente viu a mulher “inexplicavelmente” em chamas.
A penúltima vítima, em fevereiro, era de Florencio Varela, na Grande Buenos Aires. Na ocasião o marido da vítima a banhou em acetona e depois lhe jogou um fósforo aceso.
Neste domingo, na província de Santa Fe, outro homem tentou queimar sua namorada, grávida de 8 meses. No entanto, foi salva a tempo por seu cunhado.
Na Argentina no ano passado um total de 260 mulheres foram assassinadas dentro de crimes classificados de “violência de gênero”.
Nos primeiros dois meses deste ano treze mulheres haviam sido assassinadas em toda a Argentina por violência de gênero.
DADOS:
- Do total de mulheres vítimas de violência de gênero, 18% são jovens de menos de 18 anos de idade.
- Do total de mulheres vítimas de violência de gênero, 51% foram alvo dos ataques de cônjuges, ex-cônjuges ou amantes e namorados.
PESO PRESIDENCIAL – Em 1974 María Estela Martínez de Perón – uma ex-dançarina de cabaré no Panamá – assumiu a presidência da Argentina. Mais conhecida por seu apelido, “Isabelita”, ela chegava ao poder por ser a vice-presidente do marido defunto, Juan Domingo Perón, que no ano anterior havia sido eleito nas urnas.
Isabelita durou menos de dois anos no posto. Controlada pela eminência parda do governo, o ministro José López Rega, Isabelita exerceu uma presidência desorientada e caótica. Foi derrubada por um golpe militar em 1976.
Isabelita, formalmente, foi a primeira mulher presidente da Argentina. No entanto, assumiu por ser a vice do marido.
A primeira mulher a ser eleita diretamente para o cargo de presidente foi Cristina Kirchner, que sucedeu seu próprio marido, Néstor Kirchner, na presidência do país.
Nas eleições que venceu com 45% dos votos, sua principal adversária foi outra mulher, Elisa Carrió, líder da opositora Coalizão Cívica, que obteve 23% dos votos.
Desta forma, as duas mulheres obtiveram juntas 68% dos votos emitidos.
PESO PARLAMENTAR - Em 1991, durante o governo do presidente Carlos Menem (1989-99), o Congresso Nacional aprovou a lei que determina que os partidos políticos são obrigados a contar com um mínimo de um terço de candidatas mulheres.
Na época, a Câmara de Deputados e o Senado somente contavam com 6% de presença feminina.
Os resultados dessa lei, a primeira desse gênero nas Américas, foram comprovados em 1993. Graças à nova norma, a proporção de mulheres parlamentares subiu para 13,6% em 1993.
Atualmente as mulheres ocupam 38,8% das cadeiras do Senado. Além disso, estão presentes em 36,5% das cadeiras da Câmara de Deputados na Argentina.
PESO MINISTERIAL - Apesar da presença de uma mulher na presidência da Argentina, o peso feminino no gabinete presidencial é baixo. De um total de 16 pastas a presidente Cristina somente possui três mulheres ministras (uma delas é sua própria cunhada, Alicia Kirchner, ministra que herdou do marido e antecessor, o ex-presidente Néstor Kirchner).
Isto é, o gabinete possui apenas 18,7% de mulheres com hierarquia ministerial.
Além disso, das cinco secretarias de Estado do governo Cristina, nenhuma é comandada por mulheres.
UM BAIRRO ‘FEMININO’: As ruas de Puerto Madero, bairro criado nos anos 90 em Buenos Aires, conta exclusivamente com ruas com nomes de mulheres argentinas que lutaram pelos direitos de igualdade. Entre elas há médicas, intelectuais, políticas, líderes sociais, escritoras e até heroínas da independência.
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E para terminar a jornada, duas tirinhas de Mafalda… elas são dos anos 60. Mas é impressionante como são vigentes.
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terça-feira, 15 de fevereiro de 2011
quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011
mitologia oriental
Na mitologia oriental, hoje (9/2) é o dia da deusa protetora das mulheres: Kuan Yin ou Guanyin
Kuan Yin
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
A Wikipédia possui o
Portal do Budismo
Kuan Yin ou Guanyin (em chinês: 觀音; pinyin: Guānyīn; Wade-Giles: kuan-yin; em japonês: Kannon; em coreano: Gwan-eum; vietnamita: Quan Âm) é o bodisatva associado com a compaixão tal como é venerada pelos budistas da Ásia Oriental, geralmente na forma feminina. O nome Guanyin e uma abreviação de Guanshiyin (觀世音; pinyin: Guānshìyīn; Wade-Giles: kuan-shih yin) que significa "Observar os Sons (ou Gritos) do Mundo".
Os fieis de origem chinesa geralmente aceitam que Guanyin se originou com o Avalokiteśvara (अवलोकितेश्वर) sânscrito, sua forma masculina. Comumente conhecida nos idiomas ocidentais como Deusa da Misericórdia,[1] Guanyin também é cultuada pelos taoístas chineses como um dos Oito Imortais; na mitologia taoísta, no entanto, possui histórias relacionadas à sua origem que não são relacionadas diretamente a Avalokiteśvara.
A misericórdia em diferentes culturas
No budismo chinês, Kuan Yin, Guan Yin ou Guānyīn 觀音representa a compaixão ou misericórdia de todos os Buddhas e tem sua simbologia advinda do bodhisattva Avalokiteshvara, em sânscrito Avalokiteśvara (अवलोकितेश्वर), divindade tradicionalmente masculina do budismo indiano, que dá origem a várias representações asiáticas, e que chega à China com o budismo no ano de 67, sincretizando-se com divindades femininas locais. Mais tarde, no arquipelago das ilhas Filipinas, muito influenciado pela presenca do catolicismo espanhol, passou a ganhar aspectos de Madona.
Kuan Yin está associada às características femininas da maternidade e proteção, na China ligadas milenarmente de modo bastante forte à misericórdia[2]
Também no Japão a representação budista da misericórdia tem características femininas predominantes, sendo conhecida como Kannon Bosatsu観音菩薩.
No budismo tibetano recebe o nome Chenrezig, e, assim como Avalokiteśvara na Índia, tem características masculinas predominantes.
A dança da Deusa da Misericórdia
O coreógrafo chinês Zhang Jigang criou uma apresentação de dança para permitir ao público contemplar a "Kuan Yin de Mil Braços". O canal de televisão "China Central" apresentou este espetáculo ao vivo como comemoração do Ano Novo Chinês (link para um trecho do vídeo nas "páginas externas").
A dança foi apresentada por 21 dançarinas surdas integrantes da "Companhia de Arte Performática Chinesa de Deficientes Físicos." Posicionadas numa longa fila, as bailarinas conseguem dar aos espectadores a ilusão de que os movimentos de seus múltiplos braços e pernas pertencem à figura de uma única deusa.
Nu-Kua ou Kuan yin
Há cerca de seis ou sete mil anos havia um mito universal de que todos os seres eram provenientes do útero de uma Mãe Cósmica [3]; tal mito da criação universal teve lugar durante uma fase informe do mundo, aonde nada podia ainda ser identificado. Inicialmente cultuada na Índia, como Kali, a Mãe Informe, recebeu depois o nome de Tiamat (Babilônia), Nu Kua (China), Temut (Egito), Têmis (Grécia pré-helênica) e Tehom (Síria e Canaã) –este último foi o termo usado mais tarde pelos escritores bíblicos para Abismo. As mais antigas noções de criação se originavam da idéia básica do nascimento, que consistia na única origem possível das coisas e esta condição prévia do caos primordial foi extraída diretamente da teoria arcaica de que o útero cheio de sangue era capaz de criar magicamente a prole. Acreditava-se que a partir do sangue divino do útero e através de um movimento, dança ou ritmo cardíaco, que agitasse este sangue, surgissem os "frutos", a própria maternidade. Essa é uma das razões pelas quais as danças das mulheres primitivas eram repletas em movimentos pélvicos e abdominais. Muitas tradições referiram o princípio do coração materno que detém todo o poder da criação. Este coração materno, "uma energia capaz de coagular o caos espumoso" [4] organizou, separou e definou os elementos que compõem e produzem o cosmos; a esta energia organizadora os gregos deram o nome de Diakosmos, a Determinação da Deusa. Os egípcios, nos hieroglifos, chamaram este coração de ab e os hebreus foram os primeiros a chamar de pai (ainda que masculinizassem, a idéia fundamental de família e continuidade da vida não era patriarcal).
O coração e o sangue definem um elo imanente a todos os seres que dele nasceram e uma idéia de coração oculto do universo que pulsa e mantém o ritmo de ciclos das estações, dos nascimentos, mortes, destinos. Este é o significado que está no Livro dos Mortos ou das Mutações. No mesmo sentido o livro chinês é denominado Livro das Mutações.
O nome chinês dado à Mãe Primordial e informe é Nu Kua, nome referido também entre os egípcios, gregos, mesopotâmicos e hindus. As referências a ela remontam há 2.500 a.C. e a imagem permanece venerada nas regiões setentrionais. Kuan Yin ou A Mulher é uma deusa dos casamentos e das mulheres em geral. O corpo original do I Ching chama-se (Oito Trigramas) e os sessenta e quatro hexagramas são denominados por kua, derivado linguísitico de Mãe Primordial ou Nu Kua.
Referências
1.↑ [1]
2.↑ Doré, Henry, S.J. Researches into Chinese Superstitions. Trad (do fr.) M. Kennelly, S.J. Taipei, Ch’eng-Wen Publishing Company, s/d, pp..XVIII, XXI. e Blofeld, John. Mantras. Palavras Sagradas de Poder. Trad. Isa Silveira Leal e Miroel Silveira. São Paulo, Cultrix/Pensamento, 1988, pp.60-62.
3.↑ O I Ching da Deusa,
4.↑ B. Walker, O I Ching da Deusa, p. 11
Bibliografia
•Blofeld, John. A Deusa da compaixão e do amor. O culto místico a Kuan Yin. Trad. Antonio de Pádua Danesi e Gilson César Cardoso de Sousa. São Paulo, Ibrasa, 1994.
•Doré, Henry, S.J. Researches into Chinese Superstitions. Trad (do fr.) M. Kennelly, S.J. Taipei, Ch’eng-Wen Publishing Company, s/d, pp..XVIII, XXI.
Ligações externas
O Commons possui multimídias sobre Kuan Yin
Kuan Yin, estátua de porcelana chinesa da dinastia Ming.
•Kuan Yin diz que a realidade está na mente de cada um[2]
•Mestra Kuan Yin[3]
•Kuan Yin, the Compassionate Rebel
[4]
•Kuan Yin Informações, imagens e preces[5]
•Kuan Yin Descrição[6]
•Kuan Yin e o Sutra do Coração[7]
•A lenda de Miao Shan[8]
•Organização Tzu-Chi Kuan Yin na perspectiva budista[9]
•108 Glórias de Kuan Yin[1
Kuan Yin
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
A Wikipédia possui o
Portal do Budismo
Kuan Yin ou Guanyin (em chinês: 觀音; pinyin: Guānyīn; Wade-Giles: kuan-yin; em japonês: Kannon; em coreano: Gwan-eum; vietnamita: Quan Âm) é o bodisatva associado com a compaixão tal como é venerada pelos budistas da Ásia Oriental, geralmente na forma feminina. O nome Guanyin e uma abreviação de Guanshiyin (觀世音; pinyin: Guānshìyīn; Wade-Giles: kuan-shih yin) que significa "Observar os Sons (ou Gritos) do Mundo".
Os fieis de origem chinesa geralmente aceitam que Guanyin se originou com o Avalokiteśvara (अवलोकितेश्वर) sânscrito, sua forma masculina. Comumente conhecida nos idiomas ocidentais como Deusa da Misericórdia,[1] Guanyin também é cultuada pelos taoístas chineses como um dos Oito Imortais; na mitologia taoísta, no entanto, possui histórias relacionadas à sua origem que não são relacionadas diretamente a Avalokiteśvara.
A misericórdia em diferentes culturas
No budismo chinês, Kuan Yin, Guan Yin ou Guānyīn 觀音representa a compaixão ou misericórdia de todos os Buddhas e tem sua simbologia advinda do bodhisattva Avalokiteshvara, em sânscrito Avalokiteśvara (अवलोकितेश्वर), divindade tradicionalmente masculina do budismo indiano, que dá origem a várias representações asiáticas, e que chega à China com o budismo no ano de 67, sincretizando-se com divindades femininas locais. Mais tarde, no arquipelago das ilhas Filipinas, muito influenciado pela presenca do catolicismo espanhol, passou a ganhar aspectos de Madona.
Kuan Yin está associada às características femininas da maternidade e proteção, na China ligadas milenarmente de modo bastante forte à misericórdia[2]
Também no Japão a representação budista da misericórdia tem características femininas predominantes, sendo conhecida como Kannon Bosatsu観音菩薩.
No budismo tibetano recebe o nome Chenrezig, e, assim como Avalokiteśvara na Índia, tem características masculinas predominantes.
A dança da Deusa da Misericórdia
O coreógrafo chinês Zhang Jigang criou uma apresentação de dança para permitir ao público contemplar a "Kuan Yin de Mil Braços". O canal de televisão "China Central" apresentou este espetáculo ao vivo como comemoração do Ano Novo Chinês (link para um trecho do vídeo nas "páginas externas").
A dança foi apresentada por 21 dançarinas surdas integrantes da "Companhia de Arte Performática Chinesa de Deficientes Físicos." Posicionadas numa longa fila, as bailarinas conseguem dar aos espectadores a ilusão de que os movimentos de seus múltiplos braços e pernas pertencem à figura de uma única deusa.
Nu-Kua ou Kuan yin
Há cerca de seis ou sete mil anos havia um mito universal de que todos os seres eram provenientes do útero de uma Mãe Cósmica [3]; tal mito da criação universal teve lugar durante uma fase informe do mundo, aonde nada podia ainda ser identificado. Inicialmente cultuada na Índia, como Kali, a Mãe Informe, recebeu depois o nome de Tiamat (Babilônia), Nu Kua (China), Temut (Egito), Têmis (Grécia pré-helênica) e Tehom (Síria e Canaã) –este último foi o termo usado mais tarde pelos escritores bíblicos para Abismo. As mais antigas noções de criação se originavam da idéia básica do nascimento, que consistia na única origem possível das coisas e esta condição prévia do caos primordial foi extraída diretamente da teoria arcaica de que o útero cheio de sangue era capaz de criar magicamente a prole. Acreditava-se que a partir do sangue divino do útero e através de um movimento, dança ou ritmo cardíaco, que agitasse este sangue, surgissem os "frutos", a própria maternidade. Essa é uma das razões pelas quais as danças das mulheres primitivas eram repletas em movimentos pélvicos e abdominais. Muitas tradições referiram o princípio do coração materno que detém todo o poder da criação. Este coração materno, "uma energia capaz de coagular o caos espumoso" [4] organizou, separou e definou os elementos que compõem e produzem o cosmos; a esta energia organizadora os gregos deram o nome de Diakosmos, a Determinação da Deusa. Os egípcios, nos hieroglifos, chamaram este coração de ab e os hebreus foram os primeiros a chamar de pai (ainda que masculinizassem, a idéia fundamental de família e continuidade da vida não era patriarcal).
O coração e o sangue definem um elo imanente a todos os seres que dele nasceram e uma idéia de coração oculto do universo que pulsa e mantém o ritmo de ciclos das estações, dos nascimentos, mortes, destinos. Este é o significado que está no Livro dos Mortos ou das Mutações. No mesmo sentido o livro chinês é denominado Livro das Mutações.
O nome chinês dado à Mãe Primordial e informe é Nu Kua, nome referido também entre os egípcios, gregos, mesopotâmicos e hindus. As referências a ela remontam há 2.500 a.C. e a imagem permanece venerada nas regiões setentrionais. Kuan Yin ou A Mulher é uma deusa dos casamentos e das mulheres em geral. O corpo original do I Ching chama-se (Oito Trigramas) e os sessenta e quatro hexagramas são denominados por kua, derivado linguísitico de Mãe Primordial ou Nu Kua.
Referências
1.↑ [1]
2.↑ Doré, Henry, S.J. Researches into Chinese Superstitions. Trad (do fr.) M. Kennelly, S.J. Taipei, Ch’eng-Wen Publishing Company, s/d, pp..XVIII, XXI. e Blofeld, John. Mantras. Palavras Sagradas de Poder. Trad. Isa Silveira Leal e Miroel Silveira. São Paulo, Cultrix/Pensamento, 1988, pp.60-62.
3.↑ O I Ching da Deusa,
4.↑ B. Walker, O I Ching da Deusa, p. 11
Bibliografia
•Blofeld, John. A Deusa da compaixão e do amor. O culto místico a Kuan Yin. Trad. Antonio de Pádua Danesi e Gilson César Cardoso de Sousa. São Paulo, Ibrasa, 1994.
•Doré, Henry, S.J. Researches into Chinese Superstitions. Trad (do fr.) M. Kennelly, S.J. Taipei, Ch’eng-Wen Publishing Company, s/d, pp..XVIII, XXI.
Ligações externas
O Commons possui multimídias sobre Kuan Yin
Kuan Yin, estátua de porcelana chinesa da dinastia Ming.
•Kuan Yin diz que a realidade está na mente de cada um[2]
•Mestra Kuan Yin[3]
•Kuan Yin, the Compassionate Rebel
[4]
•Kuan Yin Informações, imagens e preces[5]
•Kuan Yin Descrição[6]
•Kuan Yin e o Sutra do Coração[7]
•A lenda de Miao Shan[8]
•Organização Tzu-Chi Kuan Yin na perspectiva budista[9]
•108 Glórias de Kuan Yin[1
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